O Menino e o Carrinho (Gilberto)

Quando das Bodas de Ouro de João Basilio e Alice Maria tivemos a agradável surpresa de conhecermos pequenas histórias da infância de seus filhos. Agora abrimos este novo espaço para novas historietas como aquelas. Estimulamos os irmãos a contribuírem, como já fez o Geraldo.
Responder
Gilberto SMelo
Site Admin
Mensagens: 299
Registrado em: Qui 26 Mai 2005 2:23 pm
Localização: BH-MG

O Menino e o Carrinho (Gilberto)

Mensagem por Gilberto SMelo »

Era uma vez um menino de sete anos. Ele tinha seis irmãos, um mais velho que ele e mais outros cinco menores. A família do menino não tinha muito conforto, as coisas eram muito difíceis, porque era muita gente para pouca condição de criar. Mas aquela família vivia feliz, sabia sempre valorizar o que conseguia. Qualquer pequena migalha que se conseguia era motivo de alegria, porque todos estavam acostumados a ter pouco. Aconteciam problemas de saúde um atrás do outro, mas a família prosseguia sempre achando que estava tudo bem, que tudo sempre se resolvia bem.

No natal daquele ano todos os sete filhos receberam, como sempre, brinquedos muito simples. Receberam naquele natal simples brinquedos de madeira. O menino da nossa história recebeu um carrinho de carroceria, todo de madeira, até as rodas. E havia um furinho na parte da frente do carrinho onde o menino amarrou um barbante e puxava aquele brinquedo por toda parte. Aquele carro carregava o mundo pequeno daquele menino, um mundo tão pequeno que cabia ali com folga. E lá ia o menino pra lá e pra cá com o seu carrinho que ganhou no natal. Com aquele carrinho ele se sentia feliz, porque nele transportava o seu mundo, a sua alegria e a sua satisfação com aquele mundo tão pequenininho.

No final do ano seguinte o menino ainda tinha aquele carrinho perfeito, porque gostava muito dele. E ele era muito bom porque carregava o seu mundo para lá e para cá. E os irmãos do menino também tinham os seus brinquedos e gostavam muito deles. Eles aprenderam a cuidar de suas coisas, a conservar aquilo que ganhavam e que era muito importante porque cada brinquedo carregava nele o mundo de cada um.

No ano seguinte, em que o nosso menino fez 8 anos, todos tinham ainda os seus brinquedos e nem pensavam muito em ter outros, porque aqueles que tinham eram suficientes para transportar o seu pequeno mundo sem problemas. E aconteceu que os seus pais naquele natal não podiam comprar outros presentes para aqueles meninos. O dinheiro era pouco e tinha que ser usado para outras coisas, não sobrava para comprar brinquedos.

Não havia condição de comprar presentes de natal, mas havia para comprar algumas coisas. E faltando poucos dias para o natal a mãe daquele menino o chamou e disse baixinho no ouvido:
- Pegue o seu carrinho e o brinquedo dos outros todos sem que eles percebam e traga para mim que tenho uma surpresa. A mãe do menino, aproveitando um momento em que os outros filhos estavam brincando no quintal chamou o menino no seu quarto, fechou a porta e disse:
- Neste ano não vamos poder comprar presentes para vocês, então comprei estas duas latas de tinta, uma branca e uma amarela, e também estes dois pincéis. Quero que você me ajude a pintar estes brinquedos e depois vamos escondê-los até o natal. No dia de natal vamos entregar a todos os brinquedos pintados que vão ser os brinquedos novos de todos.
- Mas não diga nada pra ninguém viu? É surpresa.

E assim o menino e sua mãe começaram a pintar todos os brinquedos. E era interessante, porque quando os outros batiam na porta para saber o que estava acontecendo, o menino e sua mãe escondiam todos os brinquedos, a tinta e os pincéis debaixo da cama para que os outros irmãos não descobrissem o que estavam fazendo. O que é um grande mistério é como conseguiam esconder o cheiro da tinta...

Assim, algumas vezes se fecharam naquele quarto foram pintando cada um dos brinquedos. A pintura não era muito perfeita, pois tanto a mãe quanto aquele menino de 8 anos nunca tinham usado antes um pincel e uma lata de tinta. Eles já tinham visto pessoas pintarem coisas grandes, como casas e móveis, mas nunca tinham visto alguém pintar algo pequeno, um brinquedo, uma coisa tão delicada e tão importante, que carregava o mundo de cada uma daquelas crianças para onde elas quisessem.

A mãe e o menino não se preocupavam muito em como espalhar a tinta, não se importavam se a tinta escorria. Para eles o mais importante não era a tinta, era o brinquedo. E o brinquedo estava ali, era real. A tinta, de qualquer maneira que fosse passada naquele brinquedo, seria sempre uma nova forma de ver aquele objeto tão importante que carregava o mundo da criança. Mas tiveram o cuidado de cortar o barbante que o menino usava para puxar o seu carrinho de madeira, para então pintar. Depois de terem terminado a pintura dos brinquedos eles foram escondidos até o natal.

Na noite de natal, naquela noite em que os sonhos nem tão compridos daquelas crianças esperavam alguma coisa de novo, os brinquedos pintados foram colocados ao lado da cama de cada um. Na manhã seguinte cada uma das sete crianças encontrou um brinquedo novo ao lado de sua cama e saiu a brincar muito com aquela surpresa pintada. E o nosso menino achou ao lado de sua cama aquele carrinho tão importante, que tinha a função de carregar o seu mundo. O seu carrinho novo era pintado de branco e amarelo e não tinha um barbante amarrado para ser puxado. Então o menino procurou logo um barbante, amarrou naquele buraquinho e saiu a puxar o seu carrinho novo, carregando o seu mundo para onde quisesse.

Hoje o menino já cresceu muito mas ainda tem aquele carrinho pintado. O barbante está cortado porque o seu mundo também cresceu muito, junto com o menino, e não cabe mais naquele brinquedo. Agora o menino carrega o seu mundo em seu coração, que sempre foi cuidado pelos seus pais. Sempre houve o cuidado de ter uma lata de tinta para pintar aquele coração que andava no peito do menino. À medida que o menino cresceu o seu coração pode crescer junto e hoje é tão grande que dá para carregar todo o seu mundo, que agora é muito maior. Este coração hoje é grande a ponto de caber tudo. Mas a parte principal que ele carrega são os pais deste menino da nossa história.

E este menino sou eu. Aqueles que pintaram os sonhos meus e de meus irmãos são meus pais: João e Alice.

Responder